U. Minho com sinais de desvalorização das carreiras (5/mar)
17 de março de 2025
O Departamento do Ensino Superior e Investigação do Sindicato dos Professores do Norte (SPN/DESI) reuniu com professores e investigadores da Universidade do Minho (UM), no dia 5 de março. Os sinais de desvalorização das carreiras de docente e de investigador na Universidade do Minho apontam como urgente a dignificação e melhoria das relações e das condições de trabalho! Na reunião, ficaram patentes várias situações que se pode caracterizar por: 1) desvalorização das funções docentes e depauperização das condições de lecionação dos professores; 2) recurso abusivo a contratações precárias na investigação para cumprimento de necessidades permanentes.
Apesar do reconhecimento de que a docência e a investigação são cruciais para o futuro do ensino superior, da ciência e do país, a valorização das carreiras dos docentes do ensino superior e dos investigadores é uma matéria que tem estado esquecida pelos governos e pelos órgãos de gestão das Instituições do Ensino Superior (IES), o que importa contrariar. A precariedade laboral tem assumido valores preocupantes, em várias instituições do país, com mais de 50% dos docentes contratados em condições precárias. Os designados falsos convidados desempenham funções permanentes sem garantias de estabilidade laboral e recebendo salários substancialmente inferiores aos dos docentes de carreira, embora tenham, muitas vezes, cargas letivas mais elevadas.
Na ciência, quase 90% dos investigadores trabalham em condições precárias, com sucessivos contratos de bolsas ou a termo, há décadas. Isto asfixia as vidas pessoais e familiares e fragiliza o sistema científico nacional, pois estes profissionais altamente qualificados não conseguem acesso à carreira, o que compromete a continuidade da produção científica e o desenvolvimento de projetos a longo prazo, essenciais para a inovação no país.
Os abusos e ilegalidades têm efeitos negativos no trabalho pedagógico que cada docente quer e tem de realizar e no esforço que requer. Acarretam consequências no bem-estar e na saúde, adensam o cansaço, o desencanto, a exaustão emocional e, não poucas vezes, originam ausências por doença, para além de contribuírem para desgastar a imagem social dos professores.
É no exercício da profissão docente em condições de trabalho indignas — elevada precariedade e instabilidade laboral, horários de trabalho sobrecarregados e burocracia infinita, excesso de atividades administrativas, violência e assédio no local de trabalho, falta de professores — que se encontram as causas do elevado número de docentes sofrendo um crescente desgaste físico e psicológico, o que potencia problemas de saúde física e mental, como stress crónico e burnout. O maior estudo realizado em Portugal sobre o desgaste na profissão docente (Inquérito Nacional sobre as Condições de Vida e Trabalho na Educação em Portugal, parceria entre a Fenprof e a FCSH/UNL, 2018), revela, entre outros dados, que 75% dos professores apresentavam desgaste emocional, 48% tinham sinais preocupantes de desgaste emocional, 27% com sinais críticos ou extremos de desgaste emocional, ou que há ligação direta entre o índice de burnout e a idade, mais visível a partir dos 55 anos de idade.
1. Desvalorização das funções docentes e depauperização das condições de lecionação dos professores
Importa dar nota das principais questões abordadas pelos docentes numa condição que se pode considerar grave de desvalorização das funções docentes e depauperização das condições de trabalho. O quadro é de envelhecimento do corpo docente, não abertura de lugares de carreira, ausência de progressão de categoria, e sobrecarga dos docentes a tempo integral. Salienta-se os seguintes aspetos:
- excesso de número de UC atribuídas face ao Regulamento da Prestação de Serviço dos Docentes de Carreira da UM;
- a imposição de serviço suplanta as 35h semanais e impede o descanso e o direito a desligar;
- supervisão de estágios com horas atribuídas que não correspondem, nem por aproximação às horas necessárias para acompanhamento e deslocações;
- atividades de orientação de teses de Mestrado e Doutoramento sem atribuição de horas letivas.
- a reposição de aulas obrigatória fere o direito de proteção na doença.
Registe-se que a liberdade de reposição de aulas tem sido uma forma abusiva de contornar um direito consagrado pela Constituição da República Portuguesa (CRP), que, no art.º 59.º, consagra a proteção na doença como garantia constitucional. Havendo necessidade de justificar a sua ausência por baixa médica, os docentes não podem ser obrigados a repor as aulas que não conseguiram lecionar e pelas quais não foram pagos.
Sentimento de vigilância e funcionalização da profissão docente, promovido pelo comunicado enviado pela reitoria sobre o registo da assiduidade e pontualidade do pessoal docente
O SPN solicitou ao Reitor da UM as evidências da alegada interferência da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) na forma de registo e assiduidade dos docentes. Até à data, não foi recebida nenhuma resposta, pelo que o Sindicato solicita que seja tornada pública, para que se possa tomar posição sobre o assunto. Sabe-se que a responsabilidade do registo de assiduidade e pontualidade do pessoal docente é da instituição e que cada instituição pode criar mecanismos de verificação próprios. Contudo, atendendo ao quadro exposto, os docentes deram nota de um sentimento de vigilância sobre o seu trabalho, sem que para tal haja razões objetivas e sentem que este tipo de procedimento acrescenta na funcionalização da prática docente, prejudicando as efetivas funções docentes.
Dificuldade de progressão na carreira, pela falta de consequências concretas da avaliação de desempenho e pela ausência de abertura de concursos
Perante o paradigma de sobrecarga de horas de trabalho, os docentes vêm-se confrontados com limitações à justa dedicação a atividades de valorização e enriquecimento do seu percurso académico. Constata-se uma deriva métrica e produtivista da produção científica, muitas vezes descolada da função pedagógica, colocando em causa o compromisso com a qualidade e com a missão do ensino superior. A baixa valorização do trabalho realizado em algumas dimensões das funções docentes e o aumento de tarefas diversas, predominantemente burocráticas, afastam e perturbam o envolvimento para com a docência.
2. Recurso abusivo a contratações precárias na investigação para cumprimento de necessidades permanentes.
Infelizmente, na UM encontra-se o mesmo padrão de abuso da figura de trabalho precário de outras instituições, para cumprir as necessidades permanentes de valorização e aperfeiçoamento científico. Em Portugal, a grande maioria dos investigadores científicos trabalha com vínculos precários, apesar de muitos desempenharem a sua atividade há anos ou até décadas. Esta precariedade compromete não apenas o futuro pessoal e profissional, como o desenvolvimento da Ciência no nosso país. Os investigadores científicos são fundamentais para o funcionamento das instituições de Ensino Superior e Ciência, seja pelos projetos de investigação que desenvolvem, pelo contributo para a viabilização dos orçamentos anuais através das verbas captadas com esses projetos, pela sua produção científica que contribui para o prestígio das instituições e da Ciência portuguesa, pelas orientações de trabalhos de mestrado e doutoramento ou pelas aulas que lecionam.
A este propósito, a Fenprof vem exigindo a criação de um regime transitório no novo Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC), atualmente em fase de discussão na Assembleia da República, que promova a integração na carreira dos investigadores doutorados que acumulam longos percursos laborais de investigação e também o prolongamento dos contratos assinados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto, até que as instituições homologuem os resultados dos concursos de recrutamento previstos no n.º 5 do artigo 6.º desse diploma e os dos concursos relativos ao programa FCT-Tenure.
A raiz destes problemas está no desinvestimento decorrente dos modelos públicos de gestão atualmente em prática, e os resultados disso estão patentes no dia-a-dia da UM. Por decisões de gestão, a falta de recursos financeiros impacta diretamente nas condições de trabalho e na qualidade da formação e da investigação. O conceito de autofinanciamento e a escassez de verbas a que isso tem dado origem tem encaminhado as instituições para financiamentos projeto a projeto, sem capacidade de um verdadeiro planeamento a longo prazo com impactos sérios na definição de uma rede de ensino superior e na defesa de um Sistema Nacional de Investigação e Inovação.
Uma luta coletiva
Esta é uma luta se trava no coletivo e os docentes e investigadores podem contar com o compromisso do SPN na defesa da valorização das carreiras, essencial para a melhoria da qualidade da educação e da investigação no país, bem como para a construção de um Portugal mais próspero e justo.