OE/2026 — Na senda da destruição da Escola Pública

13 de outubro de 2025

“Irrealista, insuficiente e comprometida com lógicas de destruição da Escola Pública” — é o resultado da primeira apreciação que a Fenprof faz da proposta de Orçamento do Estado para 1026 (OE/2026), que confirma, mais uma vez, a desvalorização da Educação em Portugal, tratando-a como uma despesa de pouca relevância e não como um investimento.

Os aumentos orçamentais, alegadamente previstos, não estão à altura das necessidades estruturais do sistema e podem, mesmo, representar uma redução, tendo em conta, por exemplo, a inflação e a forma ardilosa como o governo faz os cálculos de um alegado crescimento. Ainda esta semana, dois estudos vindos a público concluíam que há carência de professores e que a carreira docente está desvalorizada, confirmando o que a Fenprof tem dito:

  • O ano letivo 2025/26 arrancou com 3152 horários por preencher, embora 18 899 docentes tenham sido colocados nos concursos, o que evidencia que o sistema está longe de responder às necessidades efetivas.
  • As reservas de recrutamento perderam mais de 13% de candidatos num só ano — com quedas expressivas em grupos como o 1.º CEB (–27,7 %), Inglês do 1.º CEB (–36,8 %) ou Português/Inglês (–42,3 %) —, o que sugere menor atratividade da profissão docente.
  • Em inquéritos recolhidos pela Fenprof nas escolas, também se registam sobrecargas, excesso de burocracia, incumprimento dos rácios de pessoal não docente e más condições físicas nos edifícios.

Essa situação, manifestando-se no início do presente ano letivo, tenderá a agravar-se se o OE/2026 não for ambicioso e não inverter o atual rumo de desinvestimento.

Grande parte do montante já se encontra comprometido

Assim, apesar de o discurso oficial insistir no reforço e na modernização do sistema educativo, a realidade é bem diferente, e esta proposta demonstra que, infelizmente, essa situação não se alterará. O governo opta por ignorar, pura e simplesmente, a realidade e não lhe responde adequadamente. Deste modo, a proposta de OE/2026 parece prever um aumento de 3,5% na despesa com pessoal, no setor da Educação, com justificações ligadas à recuperação de tempo de serviço, contratação de novos profissionais e valorização da carreira. Isto significa que, deste montante, grande parte já se encontra ‘comprometida’ por obrigação legal ou por compromissos assumidos. A valorização real da carreira ficará, assim, comprometida se a Assembleia da República não corrigir esta situação.

Facilmente se percebe que, tratando-se de uma proposta irrealista perante os desafios e as exigências que se colocam à ação do governo, é um orçamento que confirma o adiamento ou mesmo o não reconhecimento da aposta na valorização da profissão docente ou na criação de condições dignas para atrair e fixar professores. Ou seja, se parte desse aumento já estaria ‘pré-destinado’, a verba efetiva para valorização acaba por ser menor ou inexistente. Ao mesmo tempo, o prolongamento da negociação do Estatuto da Carreira Docente até 2027, com produção de efeitos apenas em 2028, como o governo propõe e a Fenprof critica, indica que, até lá, não haverá efeitos concretos para muitos professores. Ao invés, a federação exige que esta negociação ocorra no presente ano letivo, com efeitos em 2026/2027 e baseia a sua leitura a proposta de OE/2026 nos números avançados pelo governo:

  • integração de 326,2 M€ de fundos europeus no ‘bolo’ global;
  • a estimativa do executado revela a existência de 252 M€, não realizados em 2025;
  • cálculo do alegado crescimento com base na estimativa do realizado de 2025 e não no orçamentado, falseia os dados e compara o incomparável;
  • um crescimento efetivo do orçamentado para 2026, em relação a 2025 de apenas 0,9%;
  • redução real da despesa com a Educação, tendo em conta a inflação prevista entre 2,1% e 2,3%.

Para quando a valorização do vencimento?

Fernando Alexandre afirmou recentemente que o aumento dos valores do vencimento é fundamental para captar professores para o sistema, pelo que cabe perguntar como pretende fazê-lo com a redução da despesa apresentada no OE/2026? E, sobretudo, o que fez aos 252 M€ orçamentados para 2025 e não utilizados?

Mais uma vez, falha-se no essencial — garantir condições dignas para ensinar e aprender.
Este é um OE que transforma a atual retórica sobre a “valorização da educação” num exercício vazio e, na prática, num verdadeiro insulto aos profissionais e às escolas públicas. Existe, assim, uma retórica de valorização que não encontra correspondência na realidade. Os números apresentados não batem certo com a desejada resolução dos problemas. Desde logo, porque há estudos independentes que alertam para o facto de, entre 2026 e 2030, muitos grupos de recrutamento entrarem em défice estrutural, caso nada mude.

Quanto custa o desmantelamento do MECI?

Para completar este panorama de destruição da Escola Pública, falta saber que parte do OE/2026 estará destinada ao processo de desmantelamento do Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) e à transferência de competências, designadamente para as comissões de coordenação de desenvolvimento regional (CCDR). É, igualmente, essencial conhecer o valor alocado ao financiamento do setor privado da Educação, dado que tais opções significarão um novo desvio de recursos públicos que deveriam servir o fortalecimento da Escola Pública e não a sua substituição progressiva.

2,6% do PIB para a Educação (!?) — mais um mau orçamento para a Educação

Relativamente à percentagem do PIB alocada à Educação, e tendo em conta o crescimento previsto pelo Banco de Portugal (2,1%-2,2%) para 2026 (com base num PIB de 286.469,4 milhões €, em 2025), o valor real destinado à Educação ronda apenas 2,6% do PIB. Trata-se de um valor manifestamente insuficiente, que representa menos de metade dos 6% recomendados por organizações internacionais como o Banco Mundial e a OCDE.

No que toca à despesa com pessoal, o aumento previsto de 3,5% é apresentado pelo governo como destinado à valorização da carreira docente, à recuperação do tempo de serviço e à contratação de novos profissionais. Contudo, considerando o aumento proposto de 2,15% para a Administração Pública — claramente insuficiente —, e reconhecendo que a recuperação do tempo de serviço e a contratação resultam de compromissos já assumidos, importa questionar — o que sobra, efetivamente, para a valorização da carreira?

Em suma, a proposta de OE/2026 confirma a repetição de mais um mau orçamento para a Educação, persistindo em políticas que fracassaram e afastadas das reais necessidades das escolas, dos professores e dos alunos. Este desinvestimento contínuo na Escola Pública não é um acaso nem um erro de cálculo — é uma opção política deliberada do governo, que fragiliza o ensino público e abre caminho à progressiva privatização e mercantilização da Educação.

A Fenprof reafirma a sua exigência por uma educação pública, democrática, inclusiva, e adequadamente financiada.