FCUP e ICBAS exigem reporte da greve!
17 de dezembro de 2025
Em dia de greve geral (11/dez), a Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) e o Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) enviaram comunicações aos docentes e investigadores informando que aqueles que pretendessem exercer o direito à greve estariam sujeitos a uma alegada obrigação legal de reporte dessa decisão aos recursos humanos, na FCUP, ou através do sistema SIGARRA, no ICBAS.
Ora, tal posição merece o mais firme repúdio por parte do SPN. A greve é um direito, liberdade e garantia constitucionalmente consagrado no artigo 57.º da Constituição da República Portuguesa, sendo igualmente reconhecido e protegido quer pela Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, quer pelo Código do Trabalho, regimes que coexistem nas instituições públicas de ensino superior em regime fundacional.
Nenhum destes diplomas impõe aos trabalhadores — sejam eles titulares de vínculo de emprego público ou contratados ao abrigo do Código do Trabalho — a obrigação de declarar previamente, no próprio dia ou nos dias seguintes, a sua adesão a uma greve. O único dever legal existente é o pré-aviso de greve, da exclusiva responsabilidade das organizações sindicais. A imposição de um dever de reporte nominativo da adesão à greve, ainda que sob a forma de um procedimento administrativo interno e apresentada como obrigação legal, configura uma prática suscetível de condicionar, constranger e dissuadir o exercício de um direito fundamental. Tal prática é juridicamente infundada e institucionalmente grave.
Acresce que a utilização do sistema SIGARRA – Módulo de Assiduidade para este efeito levanta sérias reservas quanto ao respeito pelos princípios da proporcionalidade, da finalidade e da minimização dos dados, constitucionalmente e legalmente protegidos. Assim, a adesão à greve não carece de autorização nem de comunicação prévia ou sequer posterior e caso um docente tenha estado ausente ao serviço em dia de greve e não tenha justificado a ausência ao abrigo de qualquer dos motivos legalmente previstos, deve o empregador presumir que a sua ausência se deu por adesão à greve.
De referir, ainda, que a invocação de orientações ou entendimentos emanados da Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) não legitima, nem pode legitimar, a imposição de deveres não previstos na lei. A DGAEP não dispõe de competência normativa para restringir ou conformar o exercício de um direito, liberdade e garantia, como é o direito à greve. Qualquer interpretação administrativa que transforme o registo da greve num dever obrigatório de declaração individual — prévia ou simultânea — carece de base legal e entra em conflito com o artigo 57.º da Constituição da República Portuguesa, bem como com o regime consagrado na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas e no Código do Trabalho.
As instituições públicas de ensino superior, incluindo aquelas organizadas sob a forma fundacional, estão vinculadas ao respeito pleno dos direitos fundamentais dos seus trabalhadores. A autonomia universitária e a autonomia de gestão não legitimam a criação de deveres inexistentes na lei nem a adoção de práticas que esvaziem direitos constitucionalmente garantidos. O direito à greve não é uma concessão administrativa. É uma garantia constitucional que deve ser respeitada por todas as entidades públicas, independentemente do modelo jurídico-organizativo que adotem.