Covid-19 — Especialistas confirmam preocupações da Fenprof (2020)

9 de setembro de 2020

Depois de perder dois meses, o que pretendem governo e ministério da Educação fazer na semana que falta? Montar o circo mediático ou serem responsáveis?

A reunião com especialistas que se realizou, no dia 7 de setembro, na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, confirmou as preocupações dos professores a que a Fenprof tem vindo a dar expressão pública: as escolas ainda não reúnem as condições necessárias para abrirem em segurança e num clima de confiança.

Para a Fenprof, reafirma-se para que não restem dúvidas, as escolas deverão abrir e manter-se abertas, pois seria muito negativo para alunos, professores, famílias e sociedade que se voltasse ao designado ensino a distância. Mas para que o ensino presencial seja uma realidade que vá além de poucas semanas, são necessárias medidas que o Ministério da Educação, com o aval da Direção-Geral da Saúde, não tomou até hoje, perdendo dois meses que teriam sido preciosos para encontrar soluções alternativas às que constam das orientações que chegaram às escolas. Pode, mesmo, afirmar-se que os responsáveis do Ministério da Educação desrespeitaram o esforço que, neste período, foi feito nas escolas para garantir as condições de segurança possíveis, mas que, por imposição da tutela, não correspondem às indispensáveis.

Rcomendações

Das intervenções dos especialistas regista-se a necessidade de:

  • realizar rastreios para travar o contágio;
  • assegurar o distanciamento (que para a comunidade é de dois metros, para as escolas, em maio, foi de metro e meio a dois metros, mas, agora, poderá ser de centímetros);
  • reduzir contactos entre 30 a 50 por cento (o que implica a redução do número de alunos nas turmas);
  • desencontrar dos horários de permanência nas escolas (que não foi implementado no 1.º CEB);
  • reforçar de forma adequada a limpeza e desinfeção de instalações (para o que se exigem mais assistentes operacionais nas escolas);
  • utilizar máscara (considerada uma das medidas de segurança mais importante).

Situações anómalas

Ora, face à insuficiência de recursos nas escolas, já começam a surgir situações anómalas e inaceitáveis. À Fenprof chegaram informações de direções de agrupamentos / escolas não agrupadas que:

  • exigem aos docentes que, entre cada aula, substituam os assistentes operacionais que não existem nas escolas, sendo eles a garantir a limpeza e desinfeção dos espaços;
  • pretendem atribuir aos alunos a responsabilidade de garantir a limpeza (cuja exigência até levou os militares a darem formação aos assistentes operacionais);
  • desviam pessoal auxiliar das salas de Educação Pré-escolar (onde os grupos não foram reduzidos e a sua presença é obrigatória) para escolas do 1.º CEB.

Estando as medidas previstas para Portugal aquém das adotadas em boa parte dos países europeus onde as escolas estão a reabrir, designadamente no sul da Europa, é natural que os problemas de saúde pública possam agravar-se rapidamente. Problemas que terão impacto nos alunos (alegadamente pouco, o que está ainda por provar), mas, também, nos professores e trabalhadores não docentes, profissionais que parecem esquecidos pelo governo, que continua sem esclarecer a situação de quem integra grupo de risco.

Também as famílias irão ficar expostas aos riscos que não foram mitigados pelas medidas do governo e se é óbvio que a escola sentirá os efeitos da pandemia, tal como se sentem na comunidade, ela poderá ser um espaço de transmissão acrescida se não forem corrigidas e reforçadas as medidas de segurança sanitária.

Circo mediático

Tal como perdeu dois meses, não atendendo aqueles que, com preocupação, pretenderam propor medidas que reduzissem o risco, governo e ministério da Educação estarão agora a preparar-se para montar o habitual circo mediático em torno da abertura das aulas, repetindo as palavras “segurança” e “confiança”, em vez de, com responsabilidade, criarem condições que permitam passar das palavras aos atos.

Perante esta lamentável situação, a Fenprof repete, com a legitimidade que decorre da sua posição de sempre (confirmada, agora, pela opinião de especialistas), que eventuais problemas nas escolas que ponham em risco a saúde e a vida daqueles que representa terão como responsável moral o ministério da Educação e, para cada caso, avaliará a existência de responsabilidade material.

Neste quadro, marcado pela falta de medidas adequadas para uma abertura segura das escolas, pela escassez de recursos humanos que garantam respostas pedagógicas acrescidas e pela recusa de diálogo com as organizações representativas dos docentes sobre segurança e saúde nos locais de trabalho (área que, nos termos da lei, é de negociação obrigatória – artigo 350.º, número 1, alínea h, da Lei n.º 35/2014), voltam a questionar-se as condições políticas do atual ministro da Educação para continuar a exercer o cargo.


Três intervenções

Regresso as aulas | Experiências anteriores - Carla Nunes, Escola Nacional de Saúde Pública

Na reunião do governo com especialistas sobre a evolução da pandemia de covid-19 em Portugal, realizada na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto a 7 de setembro de 2020, a diretora da Escola Nacional de Saúde Pública, Carla Nunes, defendeu que os estabelecimentos de ensino “não serão provavelmente ambientes de propagação mais eficazes do que outros ambientes ocupacionais ou de lazer com densidades semelhantes de pessoas”.


Epidemiologista Manuel Carmo Gomes explica como evitar uma segunda vaga após reabertura das escolas

“A reabertura das escolas tem uma grande propensão para originar uma segunda onda. Mas não é uma fatalidade, não é inevitável e até conseguimos estimar aproximadamente o que é possível fazer, em termos gerais, para a evitar”, afirmou Manuel Carmo Gomes, professor de epidemiologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e um dos peritos que participaram na reunião com políticos na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto a 7 de setembro de 2020. Em primeiro lugar, é necessário diminuir os contactos nas escolas, reduzindo-os para metade ou um terço do período pré-covid, defende o especialista, com base num modelo matemático desenvolvido por especialistas de várias universidades do país. Para isso, é preciso “flexibilizar” os regimes de aulas: “o regime misto deve ser tido em conta e em áreas de conhecimento o ensino virtual é possível.” É também necessário “maximizar” o espaço na sala de aula, reajustar horários, garantir ventilação e ter uma só sala para cada turma. Além disso, “é preciso reforçar as equipas de saúde pública, algo que os epidemiologistas andam a dizer há quatro meses”, refere Carmo Gomes, defendendo também a criação de equipas móveis para intervenções mais rápidas.


"Prevenir na Comunidade Escolar", Henrique Barros, Instituto de Saúde Pública, Universidade do Porto

Henrique Barros, presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto sublinhou que independentemente de virem a existir “ondas”, não basta prestar atenção apenas aos casos positivos, mas também aos casos assintomáticos, considerando espectável que “o índice Rt (índice de transmissibilidade) não aumente mais” do que os valores que regista atualmente. “É possível pensar que seremos capazes de controlar a situação”, disse Henrique Barros, que encerrou as intervenções públicas da reunião entre o governo e os peritos, realizada na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto a 7 de setembro, considerando também importante a reabertura das escolas, nomeadamente, para que informações do ponto de vista da saúde, cuidados de higiene e de segurança sejam transmitidas às crianças e jovens.

 

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