ESI — Respeitar os direitos de docentes e investigadores
30 de setembro de 2020
Apesar da Covid-19, condições de trabalho e direitos socioprofissionais de docentes e investigadores têm de ser respeitados
A declaração de pandemia, a 11 de março, pela Organização Mundial de Saúde, foi acompanhada, em Portugal, pela declaração do Estado de Emergência, o que aconteceu em 19 de março. Estava-se, então, no início desta situação verdadeiramente excecional que ainda vivemos e, desde logo, o trabalho e a vida em geral sofreram alterações profundas imediatas.
Agora que se inicia o novo ano letivo e a situação pandémica se vai mantendo e com ela a incerteza sobre o futuro, o MCTES, as Instituições de Ensino Superior, docentes e investigadores confrontam-se com novos desafios e soluções que, apesar da sua natureza temporária e excecional, não podem prejudicar os trabalhadores e colocar em causa direitos legalmente consagrados, designadamente nos estatutos de carreira.
A Fenprof e os seus Sindicatos têm vindo a fazer um levantamento dos planos de contingência das instituições, orientados no sentido de assegurar o predomínio do regime presencial das atividades docentes e de investigação. Dos dados até agora recolhidos relevam dois aspetos essenciais:
1) a continuada ausência do MCTES na definição de regras e metodologias gerais para todo o ensino superior;
2) a diversidade de soluções que as várias instituições (e até dentro de algumas) preveem implementar no semestre que agora se inicia.
Pelo que se apurou, para além do fornecimento dos equipamentos de proteção individual, desinfeção de salas e laboratórios ou desdobramento das turmas, encontramos, por exemplo, a adoção de um regime híbrido, com alunos em sala de aula e outros a assistirem remotamente. Da panóplia de soluções encontradas, poderá resultar o aumento das horas de contacto, com a consequente desregulação dos horários de trabalho, pelo que a Fenprof estará atenta a situações que ponham em causa o respeito pelo disposto nos estatutos de carreira ou violem os direitos fundamentais, como o direito à privacidade ou o direito a desligar. Também não deixará de ter em conta eventuais quebras de normas de segurança sanitária e, nos casos em que tal se verificar, agirá junto das adequadas autoridades de saúde pública, para que intervenham, e fará a indispensável denúncia pública.
Outro aspeto que preocupa a Fenprof neste início de ano letivo prende-se com a precariedade. Apesar do PREVPAP e de outros mecanismos, alegadamente orientados para reduzir os níveis de precariedade, estes mantêm-se elevados, pelo que a Fenprof e os seus Sindicatos estão também a acompanhar os problemas específicos enfrentados pelos trabalhadores mais precários do Ensino Superior e da Investigação Científica. Neste domínio, a Fenprof considera que a interrupção da atividade letiva presencial, independentemente do tempo que durou, não poderá ser fundamento para despedimentos e/ou não renovação de contratos de docentes convidados. A Fenprof obteve a confirmação do MCTES da prorrogação do prazo para prestação de provas de doutoramento, no âmbito do regime transitório dos docentes do Politécnico.
Na área da investigação científica, indispensável ao desenvolvimento do país, são frequentemente destacados os contributos para o avanço do conhecimento. Apesar disso, assiste-se a um enorme desrespeito pelos direitos da maioria dos investigadores em Portugal, que trabalham com vínculos precários, contratos a termo e contratos de bolsa, com prejuízo para a sua vida e para o seu trabalho, situação que urge resolver, através da regularização dos vínculos precários e da integração na carreira de investigação científica.
Ainda em relação aos direitos socioprofissionais dos docentes, a Fenprof chama a atenção para o facto de a progressão na carreira continuar praticamente congelada, levando a que um número elevado de docentes continue “bloqueado” nos patamares de base da carreira, com os consequentes prejuízos, tanto a nível pessoal, como institucional, pelo que urge retomar uma política de valorização do pessoal docente e de investigação, abrindo os concursos para promoção na carreira e, também, de ingresso indo, aliás, ao encontro dos rácios que a legislação e a A3ES exigem para a certificação das formações superiores. A progressão salarial, decorrente da avaliação de desempenho, está estagnada, pois desde a introdução do atual regime de avaliação, o MCTES e o Ministério das Finanças nunca promulgaram o diploma legal que estabelece o valor destinado à progressão salarial dos docentes que não obtiveram a menção máxima em dois períodos sucessivos, o que penaliza quem, por exemplo, é avaliado com a menção de Bom ou Muito Bom.
Hoje, como no passado, a Fenprof e os seus Sindicatos continuarão a defender os direitos dos trabalhadores do Ensino Superior e da Investigação Científica, esforço que é indissociável da luta pela valorização e pelo investimento em setores que são absolutamente estratégicos para o desenvolvimento económico, social e cultural do país. O subfinanciamento crónico do sistema nacional científico e, em particular, das instituições de ensino superior e de investigação tem de ser quebrado. Seria bom que o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030, o Plano de Recuperação e Resiliência e outros instrumentos estratégicos de planeamento e política económica permitissem dotar o setor de meios financeiros que acorram ao aumento da despesa gerada pela crise sanitária e, também por essa via, contribuíssem para o seu desenvolvimento.
A Fenprof saúda os docentes e investigadores que tanto se têm empenhado para assegurar a continuidade do processo de ensino-aprendizagem, manter as atividades científicas essenciais e encontrar respostas para os impedimentos forçados à realização normal do seu trabalho, neste quadro marcado pelas restrições impostas pelas medidas de contingência em vigor.