Estatuto do Aluno
Sindicato dos Professores do Norte / FENPROF |
Posição
sobre o diploma do Estatuto do Aluno dos
Ensinos Básico e Secundário PARECER
DA FENPROF O Secretariado Nacional da FENPROF, reunido em 11 e 12 de Julho de 2002, tendo em conta, por um lado, que os actos de indisciplina e violência nas escolas têm aumentado de forma preocupante nos últimos anos, pondo em causa a dignidade pessoal e profissional dos professores e a própria função educativa da escola e que, pelo outro, a raiz principal desse fenómeno se desenvolve no terreno da exclusão social e também da falta de condições existentes em muitas escolas, como é o caso da sobrelotação e da grande dimensão de muitas delas e de um número desadequado de alunos por turma e de turmas por professor, decide reafirmar os seguintes princípios, considerados como suporte essencial a qualquer estatuto disciplinar dos alunos: 1. É necessário reforçar o papel do professor, sem que isso de nenhum modo signifique o regresso a um regime autoritário, por parte do docente, no sentido de ele poder intervir de um modo pedagógico nas questões de disciplina, nomeadamente dentro da sala de aula. Os mecanismos pedagógicos e outros que permitam sustentar melhor a autoridade do professor devem ser harmoniosamente articulados com o papel do director de turma e do conselho de turma. O Secretariado Nacional da FENPROF
entende, ainda, explicitar que as questões de indisciplina não se
resolvem só, ou, principalmente, com a publicação de um diploma, antes
assentam, prioritariamente, em medidas preventivas de ataque e de resolução
das situações sociais de desigualdade e risco que estão na sua origem e
que, portanto, se encontram a montante da escola, e na alteração das
condições de funcionamento existentes nos estabelecimentos de ensino,
tornando-os espaços mais humanizados.
O
reforço da autoridade do professor não pode ser, também, o pretexto
para que se passe a considerar o docente, a partir de agora, como o único
ou o principal responsável pelos actos de indisciplina que se continuem a
verificar nas escolas.
Para além deste reforço importava também
enveredar por uma política educativa que invertesse a que se tem seguido,
nos últimos anos, caracterizada por uma progressiva diluição do conteúdo
funcional da profissão docente, motivada não só pela atribuição de
tarefas que pouco ou nada têm a ver com a sua função de profissionais
de ensino, como também pelo irracional número de exigências
profissionais que, hoje em dia, se colocam aos docentes.
A FENPROF considera urgente reverter tal realidade porque ela tem contribuído para o recrudescer do mal-estar da classe docente, tem gerado nos seus profissionais graves crises de identidade e de auto-estima e, em simultâneo, tem promovido a perda do prestígio social da profissão. 2. Em todas as questões disciplinares deve prevalecer a vertente correctiva sobre a vertente punitiva. A obrigação de realizar tarefas úteis à escola, que recaia sobre os alunos que cometam pequenas infracções, não deve ficar dependente, de modo absoluto, da vontade dos pais e deve ter um acompanhamento e enquadramento pedagógicos. 3. Devem ser assegurados sempre os mecanismos de defesa dos alunos, devendo sempre haver prévia audição do aluno e/ou dos pais antes da aplicação de qualquer sanção. 4. Deve ser encorajada a participação dos pais e a sua co-responsabilização nos comportamentos dos alunos. As escolas, ao obrigar os pais (e os
alunos) a assinar(em) um termo de responsabilidade, no acto da matrícula,
declarando que tomaram conhecimento do regime disciplinar contido no
regulamento interno da escola (documento que pode ter, em algumas casos, várias
dezenas de páginas), tornam a contratualização um mero
procedimento formal, sem qualquer significado real na integração dos
alunos e dos pais na comunidade educativa.
Por
outro lado é necessário dar condições efectivas aos pais e às suas
associações, em termos de legislação que compense a ausência e a
remuneração das horas de trabalho efectivamente gastas no acompanhamento
e na participação nos actos que dizem respeito aos seus educandos e à
própria representação no funcionamento dos órgãos da escola. 5. A
FENPROF considera que é preciso acabar com a situação actual que
transforma a escola num tribunal e os professores em oficiais de justiça
e, simultaneamente, defende que devem
ser agilizados os mecanismos
processuais da tramitação dos processos disciplinares.
6. Não
se devem confundir os mecanismos da assiduidade com os do aproveitamento dos alunos. Contudo, deve ser o
Conselho de Turma a ter a última palavra na decisão sobre o papel das
faltas na retenção ou não do aluno.
7. O Conselho de Turma deve ter o papel preponderante na análise das questões disciplinares. As sanções dependentes de autoridades exteriores à escola devem ter um carácter de absoluta excepcionalidade. 8. É necessário humanizar as escolas e criar boas condições de funcionamento, nomeadamente com a atribuição de um número equilibrado de alunos por turma e com a tomada de medidas que tornem as escolas espaços acolhedores e motivadores para os alunos. A FENPROF sublinha que há aspectos da organização escolar que podem contribuir para o agravamento das situações sociais que existem a montante das escolas e que acabam por se repercutir nela, se não se tiver em conta as alterações introduzidas pela massificação do ensino básico, com a generalização dos 9 anos de escolaridade, que vieram a afectar, particularmente, as escolas do 2.º ciclo (ou ciclo preparatório), que passaram a comportar mais 3 anos de escolarização com as mesmas estruturas e recursos, sem que houvesse a preocupação do ME em introduzir medidas qualitativas de melhoria das instalações e da qualidade do ensino. 9. É necessário dotar as escolas de técnicos e animadores sociais para poderem intervir de modo eficaz na cooperação com os órgãos de direcção das escolas na resolução das situações mais problemáticas existentes. O documento aprovado, na generalidade, na Assembleia da República responde de modo completamente insatisfatório a esta necessidade, fazendo referência à introdução de centros sociais de apoio escolar, mas de um modo extremamente vago e não calendarizado. Com efeito, a que equipamentos de retaguarda pode a escola recorrer para resolver os problemas psíquicos de alguns alunos, os problemas de delinquência, de droga, de violência, de miséria, de abandono, que perturbam o convívio escolar? São esses, na realidade, os problemas que estão na causa da indisciplina e da violência escolares e com os quais os professores não sabem lidar, nem têm apoios para resolver, e que, na sua grande maioria, repercutem desequilíbrios e desajustamentos sociais de vária ordem. Para os resolver será necessário criar equipas educativas, integrando vários ministérios (Educação, Segurança Social, Saúde e Justiça) e a colocação nas escolas, em regime de permanência, de técnicos especializados em psicologia e assistência social, com a função de acompanhar os alunos com problemas e procurar solucionar os conflitos. Também é necessária a institucionalização de actividades extra-curriculares, com animadores sociais e culturais, que garantam uma ocupação dos tempos livres dos alunos. Finalmente, é necessário que o ME assuma a obrigação de dar assistência jurídica às vítimas da violência escolar, assim como a reparação dos danos causados. 10.
É necessário não enunciar apenas formalmente os direitos dos
alunos, sem estabelecer os meios e os mecanismos que permitam às
escolas criar as condições para o exercício e a prossecução desses
direitos, como por exemplo a inexistência de um orçamento
específico (como acontece em muitas escolas ou agrupamentos de escolas)
ou de um quadro de professores para responder aos alunos com necessidades
educativas especiais ou, sequer, a existência de condições
mínimas que assegurem aos jovens professores a estabilidade de
emprego. Como é possível, nestas condições, garantir o direito dos
alunos a ?usufruir do ensino e de uma educação de qualidade?? 11.
É necessário considerar com maior relevo as questões de
disciplina e controlo de classe no currículo da formação inicial e contínua
dos professores. 12. É necessário dar um carácter prático aos aspectos ligados à educação para a cidadania e à formação cívica, no sentido de consciencializar os alunos, os pais e os professores, para os seus direitos e deveres e respectivo relacionamento dentro da escola, entendida como uma comunidade educativa. 13. É necessário transformar a escola num espaço inclusivo e não de exclusão para os alunos oriundos de grupos sociais, étnicos ou culturais mais desfavorecidos, devendo ser feita uma educação multicultural. 14. É também necessário adoptar um projecto educativo que afaste a escola da promoção da competição exacerbada entre os alunos e de uma estratégia de ensino exclusivamente voltada para os exames. 15. A discussão pública em torno do diploma deve ser ampla, representativa e diversificada, mas não pulverizada, necessitando de eleger interlocutores credíveis e credenciados e o resultado da discussão deve ter acolhimento substantivo e ponderado sob a forma da legislação que deve ser elaborada, na especialidade, pela Assembleia da República. A
FENPROF considera inaceitável que a discussão pública em torno do
diploma se quede na superfície do discurso, por mais aliciantes que sejam
as palavras, pois é indispensável avaliar da sua aplicabilidade e do seu
grau de eficácia. Para além da bondade dos princípios e da correcção
das formulações encontradas para os explicitar, trata-se de equacionar
quais os meios disponíveis, as estratégias de operacionalização e a
sua adaptabilidade à realidade existente que é muito diversificada e mutável. No diploma final, mais do que ver reflectida a opinião de uma maioria política na Assembleia da República, importava obter dos parlamentares e de todos os parceiros educativos uma harmonia significativa e substantiva de consensos e de conteúdos. 12 de Julho de 2002 O Secretariado Nacional
|