Semana da Igualdade (5 a 12/mar)
06 de março de 2025
50 anos da comemoração do 8 de março em Liberdade
Assinalam-se este ano, os cinquenta anos em que as mulheres portuguesas comemoraram pela primeira vez em liberdade o 8 de março, Dia Internacional da Mulher. 1975 reuniu a feliz coincidência de a Assembleia Geral das Nações Unidas o ter designado como Ano Internacional da Mulher, tendo o Conselho de Ministros de Portugal ratificado essa efeméride através de uma resolução do Conselho de Ministros logo em janeiro desse ano.
Portugal, saído de uma ditadura que restringiu os mais básicos direitos da população, com consequências desastrosas para a vida e desenvolvimento das mulheres, dava os seus primeiros passos na democracia. Quando se olha para trás e nos lembramos dos decretos-lei que foram saindo nos anos a seguir a 1974, percebe-se o atraso em que as mulheres portuguesas viviam e os avanços que foram sendo feitos com conquistas de direitos. Hoje, quando se fala aos jovens do que era a vida do nosso povo em ditadura e se conta quais foram as primeiras medidas que houve que tomar para minorar o abismo que era a vida das mulheres, é com espanto e incredulidade que nos olham e nos escutam.
No entanto, grupos de mulheres logo se organizaram e quando a 1.ª Conferência Mundial do Ano Internacional da Mulher, sob o lema “Igualdade, Desenvolvimento e Paz”, se realizou no México, entre 19 de junho e 2 de julho de 1975, Portugal fez-se representar por uma delegação presidida por Maria de Lurdes Pintasilgo, tendo Maria Regina Tavares da Silva apresentado a declaração de Portugal à Conferência. Esta Conferência foi muito importante: tendo como tema central a eliminação da discriminação da mulher e tendo aprovado um Plano de Ação, dela saiu a proclamação da Década da Mulher entre 1976 e 1985. O impulso desta Conferência Mundial e das seguintes (1980 – Copenhaga, 1985 – Nairobi, 1995 – Pequim) sob a égide das Nações Unidas teve um impacto enorme e global no alargamento e consolidação dos movimentos organizados de mulheres em todo o mundo e da compreensão do longo caminho ainda a percorrer.
Portugal beneficiou deste extraordinário movimento patrocinado pelas Nações Unidas e sempre acompanhou estas conferências quer em delegações oficiais, quer em fóruns informais e independentes que se realizaram à margem dos eventos oficiais. Mas a energia saída da revolução de Abril e a força do que foi consignado na Constituição de 1976, que estabelece a igualdade entre mulheres e homens em todos os domínios tornou o nosso processo algo de único e muito particular.
Desde logo, a abolição de todas as restrições baseadas no sexo quanto à capacidade eleitoral. O acesso das mulheres a todos os cargos da carreira administrativa local, à carreira diplomática e à magistratura. A alteração do artigo XXIV da Concordata que permitiu que os casados pela Igreja pudessem aceder ao divórcio. A abolição do direito de o marido abrir a correspondência da mulher. A aprovação da licença de maternidade de 90 dias em 1976. A entrada em vigor da revisão do Código Civil em 1978 foi fundamental para e estatuto emancipatório das mulheres: segundo o Direito da Família, a mulher casada deixa de ter estatuto de dependência para ter um estatuto de igualdade com o homem. Desaparece a figura do “chefe de família”. O governo doméstico deixa de pertencer, por direito próprio à mulher. Deixa de haver poder marital: ambos dirigem a vida comum e cada um a sua. Os cônjuges decidem em comum qual a residência do casal. Marido e mulher podem acrescentar ao seu nome, no momento do casamento, até dois apelidos do outro. A mulher deixa de precisar de autorização do marido para ser comerciante. Cada um dos cônjuges pode exercer qualquer profissão ou atividade sem o consentimento do outro. A CITE – Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego – foi criada em 1979 para promover a aplicação do decreto que visava garantir às mulheres a igualdade com os homens em oportunidades e tratamento no trabalho e no emprego. Data de 1982 a entrada na Assembleia da República de três projetos-lei sobre maternidade, planeamento familiar e despenalização do aborto. A luta pela despenalização do aborto foi uma longa luta, cheia de peripécias e alvo de dois processos referendários, tendo finalmente saído vitoriosa em fevereiro de 2007, com a vitória do SIM, a pedido da mulher até às dez semanas de gestação. A atividade publicitária é regulamentada, de modo a não permitir a utilização da imagem da mulher como objeto, nem de forma discriminatória. A Lei da Nacionalidade trata nos mesmos termos os indivíduos de ambos os sexos e os filhos nascidos dentro e fora do casamento. Em 1982, finalmente se descriminaliza a homossexualidade, através de uma alteração ao Código Penal e a prostituição deixa de ser penalizada, sendo punido quem fomentar, favorecer ou facilitar a sua prática ou quem ganhar a partir da exploração da prostituta. A lei de agosto de 1991 que garante a proteção adequada às mulheres vítimas de violência só será regulamentada em 1999 com a criação das primeiras casas de abrigo da rede pública para mulheres vítimas de violência. Ainda em finais do século são aprovadas leis que alargam o período de licença de maternidade, sendo valorizado o papel de partilha dos homens no acompanhamento da criança recém-nascida. Assim, a mulher trabalhadora tem direito a uma licença por maternidade de 120 dias consecutivos, 90 dos quais necessariamente a seguir ao parto, podendo os restantes ser gozados, total ou parcialmente, antes ou depois do parto. O pai tem direito a uma licença de cinco dias úteis, seguidos ou interpolados, no primeiro mês a seguir ao nascimento do filho. O pai tem ainda direito a licença, por período de duração igual àquele a que a mãe teria direito, por decisão conjunta dos pais, entre outros casos.
A partir de 2010 é aprovado um conjunto de leis que vão efetivar direitos até então vedados a pessoas com identidades de género e orientação sexual não hétero-normativa: a lei do casamento entre pessoas do mesmo sexo; a possibilidade de as pessoas de nacionalidade portuguesa, maiores de idade, procederem ao registo de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil; o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa. Os menores entre os16 e os 18 anos de idade, por meio de representantes legais, passam a poder solicitar a mudança de menção do sexo e nome no registo civil.
É extensa a lista de leis produzidas na Casa da Democracia e que resultaram da conjugação de esforços e de vontades dos representantes do Povo na Assembleia da República, fruto também das movimentações de cidadãs e cidadãos para reforçar a Igualdade entre Mulheres e Homens. Muito há a fazer ainda, pois que a violência contra as mulheres e meninas continua a ser um flagelo diário com registos de mortes inadmissíveis; as discriminações no trabalho e emprego persistem com reflexos nos salários e mais tarde nas reformas e pensões; as violações de direitos inscritos nas leis e na Constituição são uma constante.
50 anos passaram e a correlação de forças a nível nacional e mundial tem vindo a alterar-se profundamente, com o ascenso de forças de extrema-direita, retrógradas, conservadoras e saudosas de um tempo que muitos pensavam enterrado. O ataque é profundo e em primeiro lugar e com maior ferocidade o alvo é os direitos alcançados pelas mulheres. Nos Estados Unidos, desde a subida de Trump ao poder, projetos de investigação com menção de “mulher” ou “género” são eliminados à partida e o conteúdo dos livros escolares está a ser alvo de uma verificação, no sentido de eliminar conteúdos relacionados com igualdade de género. Em Portugal, a direita uniu-se numa purga contra o guia “Direito a Ser na Escola: Orientações para a prevenção e combate à discriminação e violência em razão da orientação sexual, identidade de género, expressão de género e características sexuais, em contexto escolar” que foi publicado em 2023 pela Direcção-Geral da Educação.
1975-2025. Vamos comemorar 50 anos da primeira vez que as mulheres portuguesas comemoraram o seu dia na rua, em liberdade, em democracia. Cientes do longo caminho de conquistas alcançadas e dos riscos que presentemente colocam esses direitos e conquistas na mira da direita e dos saudosistas da imagem da mulher como “fada do lar”. A nossa determinação leva-nos a gritar: Não passarão!
Almerinda Bento
DPA/Fenprof
SEMANA DA IGUALDADE (CIMH / CGTP-IN)
05/mar (a partir das 10h00) — Realiza-se uma Sessão em Lisboa (Biblioteca Orlando Ribeiro – Telheiras), que juntará mais de uma centena de representantes sindicais, oradores/as convidados/as e a presença do Secretário-geral, Tiago Oliveira.
06/mar — Greve das Carreiras não revistas na Função Pública, que abrange um elevado número de de mulheres trabalhadoras.
07/mar — Realiza-se em Lisboa, a partir das 14h30, no Largo Luís de Camões (Chiado) a Tribuna “OIÇAM-NOS. Resistimos. Lutámos. Ganhámos!”, com testemunhos de diversas trabalhadoras e a presença do Secretário-geral da CGTP-IN.
08/mar — Dia Internacional da Mulher Trabalhadora, que este ano assinala 50 anos de comemoração em liberdade, vão realizar-se diversas iniciativas junto de mulheres que trabalham por turnos e ao fim-de-semana, em vários locais de trabalho, em todo o país.